Em decisão judicial, a juíza Márcia Simões Costa, substituta na 1ª Vara Criminal de Feira de Santana, rejeitou uma série de argumentos apresentados pela defesa do deputado estadual Kléber Cristian Escolano de Almeida (PRD), conhecido como “Binho Galinha”, e demais réus no processo deflagrado com a Operação El Patron. Entre os reús estão Mayana Cerqueira da Silva (esposa do parlamentar) e Guilherme Cerqueira da Silva Escolano (filho de Galinha). A magistrada determinou o prosseguimento da ação penal que investiga crimes como exploração de jogo de azar, usura e possível envolvimento em organização criminosa de alta periculosidade. O processo, que avança agora para a fase de instrução, possui audiências marcadas para os dias 25, 27 e 30 de junho de 2025.
Um dos principais pontos de contestação da defesa de Binho Galinha foi a alegação de foro privilegiado, argumentando que, como deputado estadual, ele deveria ser julgado em instância especial. No entanto, a juíza afastou o argumento, destacando que os crimes imputados não guardam relação com as funções parlamentares dele. Além disso, em manifestação nos autos, o Ministério Público ressaltou que as investigações começaram no dia 14 de novembro 2022, antes mesmo da diplomação do parlamentar, que ocorreu em 16 de dezembro de 2022, reforçando a que os delitos não estão vinculados à atuação política dele.
“Diferentemente do quanto sustentado pela defesa, os crimes em apuração não guardam nenhuma relação com o cargo público eletivo ocupado pelo réu Kléber Cristian Escolano, o que é cabalmente demonstrado pelo fato de que o inquérito policial ter sido instaurado antes mesmo da sua diplomação (o IPL foi instaurado no dia 14/11/2022, enquanto a diplomação foi dia 16/12/2022)”, afirmou o representante do MP.
Um movimento processual que chamou atenção da magistrada foi a indicação de 79 testemunhas pela defesa de Binho Galinha. Além do número ter sido considerado excessivo pela juíza, foi interpretado como uma tentativa de prolongar desnecessariamente o processo como uma “estratégia de alguns dos advogados de tumultuar a ação penal, para arrastar o processo por longo período, com o que o poder judiciário não pode ser conivente”, frisou a magistrada.
Para além do exagerado número de testemunhas arroladas pelo deputado, outro ponto merece ser destacado: a indicação do deputado federal João Carlos Bacelar, conhecido como Jonga Bacelar, e do deputado estadual Adolfo Menezes, que uma vez afirmou os deputados são “reféns” do parlamentar e sentem “medo” de avançar nas investigações na Comissão de ética contra Binho Galinha. O parlamentar réu repudiou as declarações do então presidente da Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA).
Outro arrolado como testemunha é o tenente-coronel José Hildon Brandão Lobão, afastado do cargo de coordenador do Departamento de Polícia Comunitária e Direitos Humanos da Polícia Militar após a Operação Hybris, um desdobramento da El Patron.
A magistrada limitou a oitiva a oito testemunhas por parte e permitiu que depoimentos fossem realizados por videoconferência para agilizar os trabalhos.
A defesa do deputado também tentou invalidar provas obtidas a partir de uma denúncia anônima, alegando que isso contaminaria todo o processo. A juíza afirmou que permitem o uso de denúncias anônimas como ponto de partida para investigações, desde que corroboradas por outros elementos probatórios. Segundo a sentença, a Polícia Federal e o Ministério Público apresentaram relatórios técnicos e diligências independentes que sustentaram as acusações, o que afastou a alegação de ilicitude das provas.
“Sobre isso, é relevante consignar que a Polícia Federal iniciou as investigações não apenas a partir da denúncia anônima acima mencionada, mas também – e principalmente – em virtude dos relatórios técnicos encaminhados pelo Ministério Público (…), logo não há que se falar em nulidade das provas colhidas, uma vez que existia investigação regularmente instaurada e lastreada em indícios robustos de autoria e materialidade acerca dos fatos em apreço”, destacou o promotor de justiça.
Outro argumento rejeitado foi o de quebra da cadeia de custódia, com as defesas alegando falhas na preservação de provas. A magistrada considerou que não houve demonstração de adulteração ou prejuízo concreto, mantendo a validade do material coletado.
“Especificamente, a defesa não demonstrou nenhuma adulteração concreta do vestígio ou manipulação indevida que comprometesse a idoneidade da prova. O entendimento esboçado pelas Cortes Superiores é claro ao exigir que eventuais falhas na cadeia de custódia sejam acompanhadas da comprovação de prejuízo efetivo à defesa, o que não ocorreu no presente caso”, afirmou a juíza.
Além disso, a preliminar de prescrição para os crimes de jogo de azar e usura foi descartada, pois, segundo o documento, os delitos foram cometidos de forma contínua, o que impede o início da contagem do prazo prescricional enquanto as atividades criminosas persistiam.
A defesa de João Guilherme Cerqueira da Silva Escolano, um dos réus e filho de Binho Galinha, tentou afastar sua responsabilidade alegando que parte dos crimes teria ocorrido antes de ele completar 18 anos. A juíza, contudo, destacou que a denúncia se refere apenas a condutas praticadas após sua maioridade penal, afastando a tese de inimputabilidade.
Por fim, a juíza encerrou a decisão com um alerta: a apresentação de atestados médicos ou outros recursos com o único intuito de retardar o processo será rigorosamente apurada, sinalizando ainda que não tolerará manobras protelatórias, ou seja, para atrasar o andamento do processo.
OPERAÇÃO EL PATRON
Binho é o principal alvo da operação “El Patron”, com processo que corre em segredo de justiça, sendo apontado como chefe de uma suposta milícia na região de Feira.
A organização criminosa é apontada pelo Ministério Público como atuante na prática de receptação, contravenção do jogo do bicho, extorsão, agiotagem, lavagem de capitais e outros delitos. Tudo teria se dado ainda na década de 1990, quando a organização criminosa foi constituída. O deputado teria assumido a liderança do grupo em 2013, a partir do homicídio do bicheiro Oldair José da Silva Mascarenhas, conhecido como Dainho, e ex-sócio de Kléber Cristian.
O monopólio de Galinha no comando das atividades se estabeleceria até os dias atuais, de acordo com o MP. A investigação apontou que a prática da contravenção seria uma das “exclusividades” de Binho Galinha, com o domínio da prática do jogo do bicho, por meio da entidade “ParaTodos”, ampliando a execução de outras atividades, segundo a investigação.