A Galeria Mercado, novo equipamento cultural entregue pela Prefeitura na semana passada, vem encantando os visitantes desde a inauguração, realizada pela Prefeitura na última quarta-feira (10). O espaço, que funciona no subsolo do Mercado Modelo, no Comércio, propõe um mergulho na história de Salvador e de um dos mercados mais famosos do Brasil.
Com objetivo de ampliar o panorama artístico da cidade e destacar personalidades que fizeram parte da sua trajetória, a Galeria une a contemporaneidade da obra de Vinicius S.A ao modernismo de Mário Cravo Jr. e Rubem Valentim. O equipamento foi o primeiro local escolhido pela baiana e fisioterapeuta Socorro Almeida para levar o grupo de amigos paulistas que acabara de chegar a Salvador.
“Estava doida para vir. Eles acabaram de desembarcar e corremos logo para conhecer essa beleza. Que lugar incrível! Fantástico, uma ideia linda e sensível. Uma construção bastante inovadora que carrega nossa história. Salvador merece um espaço como esse”, disse, encantada, enquanto posava para fotos ao lado do grupo de visitantes.
A repercussão do espaço nas redes sociais chamou atenção da brasiliense Mariana Pompeia, 22 anos, recém-chegada à capital baiana. Ao lado dos avós, também nascidos no Distrito Federal, a jovem parecia vislumbrada a cada foto. “Uma pessoa exibiu um vídeo no TikTok e fiquei com muita vontade de vir. Achei tudo tão bonito e disse aos meus avós que precisava conhecer esse lugar”, revelou a visitante.
Mostra permanente – O mais novo ponto turístico é administrado pela Secretaria de Cultura e Turismo (Secult) e, inicialmente, o funcionamento do local é das 10h às 14h, de terça a domingo, com acesso pela fachada principal. Todas as exposições são permanentes e os ingressos são gratuitos até o dia 31 de março, podendo ser retirados através do link www.sympla.com.br/produtor/galeriamercado. Mais de 1 mil pessoas já garantiram o bilhete.
A galeria de arte abriga obras como as esculturas de Exu, da série “Cabeças de Tempo” de Mário Cravo Jr., as obras em concreto de Rubem Valentim, da série “Templos de Oxalá”, a famosa instalação “Lágrimas”, de Vinícius S.A., e a escultura “São José” do artista Zé Eugênio. A curadoria do espaço é de Thaís Darzé.
Além das obras quem mantem viva a memória do Mercado, um conjunto de 16 imagens contam a história do local numa linha do tempo. De sua construção ao incêndio de 1984, as fotografias passam por festas que aconteceram no local e personagens importantes para essa história, como Maria de São Pedro e o comerciante conhecido como Camafeu de Oxóssi, que dão nome aos restaurantes do Mercado, além de personalidades como Mãe Menininha do Gantois, Mãe Senhora e o músico Raimundo Nonato da Cruz, o Chocolate da Bahia. Ao lado de cada obra, placas descritivas, com QR Code e recurso em língua inglesa e libras, facilitam o entendimento dos visitantes.
Obras – As obras retratam três diferentes gerações da arte na capital baiana. Nascido em 1983, Vinicius S.A integra a exposição com a obra Lágrimas de São Pedro, que conta com 15 mil lâmpadas reutilizadas preenchidas com resina. Ele trabalha com esse projeto desde 2005 e já levou para mais de dez cidades do Brasil, além de Las Vegas, nos Estados Unidos, e Frankfurt, na Alemanha.
Integrante do Movimento de Renovação das Artes Plásticas na Bahia, o artista plástico Rubem Valentim (1922-1991) é reverenciado através de três esculturas produzidas por ele, da série Templo de Oxalá. Imponentes, os monumentos brancos se apropriam das formas geométricas para fazer referência aos orixás.
Distribuídas pelo ambiente, mais três esculturas se destacam, ainda que pequenas em estatura: o Exu, Cabeça e uma terceira obra sem título, todas da série Cabeça de Tempo, de Mário Cravo Jr (1923-2018), integrante da primeira geração de artistas plásticos modernistas da Bahia. As obras são feitas com base na carranca e utilizando a madeira do incêndio que ocorreu no atual Mercado Modelo, na década de 1980.
Além dessas, duas outras peças completam a coleção, estas de um modo mais curioso. Encontradas durante a organização do espaço para a revitalização, após os 15 anos que o subsolo passou fechado, a Nossa Senhora da Conceição e o São José, ambos de autoria não identificada, foram rapidamente integrados à galeria.
Transformado em espaço cultural, o espaço teve toda a estrutura das arcadas em pedra restaurada. Com isso, o pavimento desativado há mais de dez anos passou a ter sistema de renovação do ar e ilhas de conforto climatizadas. Todo o projeto de requalificação do Mercado Modelo é assinado pela Fundação Mário Leal Ferreira (FMLF), em parceria com o Iphan. O mercado foi tombado pelo órgão há mais de 50 anos.
História – O historiador Murilo Melo conta que existem muitos mitos sobre o prédio do Mercado Modelo, em especial, sobre o subsolo. “O espaço nasceu para abrigar vinhos, mas esse lençol de água não permitiu, logo permanece fechado por anos e anos. Foi um edifício neoclássico, construído para servir como terceira casa de alfândega. Existia uma ponte por onde os produtos eram desembarcados e essa foi a finalidade dele por muitos anos, até abrigar as lojas que vemos hoje. As lendas populares de que o subsolo abrigava escravos é puro folclore”, ressalta.
Para o estudioso, a ideia da Galeria Mercado foi brilhante. “Isso aqui tem um valor histórico absurdo para Salvador, para Bahia e para o Brasil. É importante que as pessoas conheçam, em primeiro lugar os baianos, tomem parte da sua história e desmistifiquem tantos mitos. É também mais uma possibilidade poder levar essa informação para turistas que visitam nossa terra. Salvador se constitui como uma cidade turística com esse potencial e acho que é o caminho certo para gente”, enfatiza o historiador.