Faltam 102 dias para os Jogos Olímpicos de Paris 2024. E uma das principais estrelas do evento pode não ficar pronta a tempo ou ser descartada. O Rio Sena está cheio, sujo e o seu esquema de segurança inspira cautela.
Nesta segunda-feira (15) o presidente francês Emmanuel Macron admitiu novamente que o governo pensa em locais alternativos para a realização da cerimônia de abertura da Olimpíada, no dia 26 de julho. “Existem planos B e C e nós estamos os preparando em paralelo”, disse em entrevista à emissora BFM, afiliada da CNN na França.
Pela primeira vez, o presidente afirmou que os planos B e C seriam o Trocadero, na base da Torre Eiffel, ou o Stade de France, palco da partida entre França e Brasil na final da Copa do Mundo de 1998.
“Faremos uma análise em tempo real. E nós preparamos uma cerimônia que se limitaria ao Trocadero e que, portanto, não cobriria todo o Sena, ou mesmo uma cerimônia que trouxesse o público de volta ao Stade de France, porque é isso que se faz tradicionalmente”, afirmou Macron.
Há uma enorme preocupação com ameaças terroristas na cerimônia, que será a primeira fora de um estádio da história das Olimpíadas. Na entrevista concedida no Grand Palais, reaberto nesta segunda após reformas para receber as competições de esgrima e taekwondo, Macron lembrou que será montado um perímetro de segurança oito dias antes da abertura e tentou manter o discurso de confiança.
“Se existe um lugar onde seu filho estará seguro é lá”, respondeu o presidente à pergunta de um telespectador. “Sempre há riscos na vida, mas nós encontramos os meios. Nós nos antecipamos, estamos montando um perímetro de segurança muito grande, vamos triar as pessoas que saem, restringir o trânsito”, disse.
Macron também respondeu às perguntas sobre a despoluição do rio. Duas modalidades estão previstas para acontecer no Sena: a maratona aquática e a prova de natação do triatlo. E como legado dos Jogos, o governo francês diz que qualquer pessoa poderá nadar no rio a partir de 2025.
Depois de já ter afirmado em outras duas ocasiões que ele mesmo vai nadar no Sena, Macron disse que não “mudou de ideia” sobre se banhar no rio e garantiu que “estará lá”.
“O Sena e o Marne [um dos principais afluentes do Sena] serão um dos maiores legados destes Jogos”, afirmou o presidente francês. “Gastamos mais de 1 bilhão de euros de dinheiro público com estações de tratamento de águas, com estações de filtragem, com a redução do que foi despejado no Sena e no Marne”, completou.
Rio Sena em “estado alarmante”
Há duas semanas, a ONG francesa Surfirider, focada na proteção de oceanos, alertou que as águas do Sena estão em um estado alarmante.
Junto ao Eau de Paris, laboratório que presta serviços à prefeitura de Paris, e à Analy-Co, auditoria especializada em meio ambiente, a ONG colheu amostras no Sena por sete meses, entre as pontes Alma e Alexandre III, nos locais exatos dos eventos das Olimpíadas.
O resultado revelou que há uma taxa excessiva de contaminantes, incluindo as bactérias fecais Enterococcus spp. e Escherichia coli, que estão com concentrações duas a três vezes maiores do que os padrões aceitáveis para nado.
As chuvas são o principal fator de poluição do Rio Sena. Quando chove muito, o rio absorve o excesso de esgoto para que a cidade não sofra com enchentes. E os três primeiros meses de 2024 estão entre os mais chuvosos da região de Paris dos últimos 30 anos.
O governo francês argumenta que a coleta de amostras não deveria ser feita no período de chuvas, mas sim no verão, e diz que o trabalho não está concluído. A principal obra para despoluição do Rio, a bacia pluvial de Austerlitz, deve começar a funcionar só agora em abril. O enorme reservatório vai recolher as águas da chuva com o objetivo de melhorar a qualidade do Sena
As obras de despoluição totalizam um investimento de 1,5 bilhão de euros e se dividem em três frentes: a construção de grandes túneis e reservatórios para recolher a água da chuva, que é o principal foco; ligar casas antigas ao sistema de coleta de esgoto; e orientar donos de barcos a levar dejetos para pontos de tratamento instalados no Sena.
Na última quarta-feira (10), o Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos Paris 2024 admitiu que o Sena é uma preocupação e que eles trabalham com alternativas, como por exemplo adiar as datas de competição. Mas mantiveram o discurso de confiança.
Desde 1923 não é possível nadar no Sena. Diversos políticos prometeram despoluir o rio sem sucesso. Mas com a Olimpíada, a promessa se renovou e as expectativas também.
Além da poluição, outro problema trazido pela chuva é o nível do rio, que está atrapalhando o planejamento da cerimônia de abertura dos jogos.
Um evento teste com barcos marcado para o dia 8 de abril foi adiado para 27 de maio porque o nível do rio está tão alto, que as embarcações não são capazes de navegar embaixo das pontes. E o atraso aumenta as preocupações que já existiam com a segurança da abertura, que vai ser a primeira fora de um estádio da história dos jogos.
Na noite de 26 de julho, cerca de 200 barcos devem navegar por um trajeto de seis quilômetros do rio, incluindo os cerca de 100 barcos reservados às delegações.
O Sena, com todo o seu protagonismo na Olimpíada, virou uma questão de honra para o governo francês. Em um evento que será observado pelo mundo todo, o rio mais emblemático da França pode se tornar palco de um momento histórico ou de um grande fiasco.