Durante uma sessão acalorada do Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), realizada nesta quarta-feira (16), a corregedora das Comarcas do Interior, desembargadora Pilar Célia Tobio de Claro, teceu duras críticas a juízes que atuam no interior do estado, mas não residem nas comarcas onde deveriam estar presentes. Conforme a Corregedoria, atos como esse têm afetado o acesso da população à Justiça.
“Tem sido difícil para os corregedores encontrarem os magistrados residindo na comarca”, desabafou Pilar. Ela relatou que, mesmo durante visitas previamente anunciadas, muitas vezes os juízes só aparecem para “cumprir protocolo”, e que, em outras ocasiões, nem os presidentes de tribunais conseguem encontrar o juiz nos fóruns. “Vamos parar de tapar o nosso rosto com peneira. Hoje a realidade da Bahia, e também do Brasil, é essa”, afirmou a magistrada.
O debate surgiu a partir da análise do pedido de um juiz que, após 22 meses atuando em uma comarca, solicitou autorização para residir fora dela somente quando decidiu se inscrever para uma remoção. Pilar reforçou que a legislação não permite flexibilizações com base em desempenho ou produtividade. “A norma não me dá, na Corregedoria, o direito de transpor exigências nem requisitos”, frisou. “O CNJ vem dizendo que é dever do magistrado morar na comarca.”
Além de Pilar, o desembargador Paulo Alberto Nunes Chenaud alertou para o risco de abrir precedentes perigosos ao permitir que juízes ignorem essa obrigação legal. “Vamos dar uma testada aqui para que os juízes não residam na comarca. Depois, se houver irregularidade, ele pede para morar fora. Isso é perigoso.”
Já a presidente do TJ-BA, desembargadora Cynthia Maria Pina Resende, destacou que a produtividade, embora relevante, não substitui o cumprimento das obrigações legais. “A produtividade é outra coisa. Isso não tem nada a ver com residir na comarca. Um juiz pode produzir muito, mas se ele não mora nem comparece ao fórum, está descumprindo dever legal.”
Ela ainda relatou um caso recente, quando um advogado procurou seu gabinete para resolver uma questão na comarca de Cipó e revelou sequer conhecer o juiz responsável, pois este não comparecia ao local. “Além de não morar, ele não vai à comarca. Não atende advogados, não abre agenda. Isso é grave.”
O desembargador Alberto Raimundo Gomes dos Santos reforçou a importância da presença do magistrado na comunidade, compartilhando sua própria trajetória como juiz atuante no interior. “Nunca tive medo da comunidade. Sempre participei da sociedade onde morava, e isso foi importante para mim e para muitos deles. Os juízes precisam deixar de ser ‘garotos de playground’ e assumir seu papel como figuras públicas e comprometidas com a sociedade.”
Na mesma linha, o desembargador Roberto Maynard Frank, em sua fala como corregedor-geral, foi categórico ao afirmar que, mesmo compreendendo o debate, não pode se desviar das regras estabelecidas. “Se o tribunal quer mudar a norma, que tenha a coragem de enfrentá-la de frente. Mas, enquanto ela existir, cabe a nós cumpri-la. Como corregedor, não posso dizer que o juiz pode o que a norma expressamente diz que não pode.”